'Às vezes tu dizias: os teus olhos são peixes verdes! E eu acreditava. Acreditava porque ao teu lado todas as coisas eram possíveis'

04 outubro, 2007

Esta cidade que [des]habita



Existe um rasto de silêncio pelas
ruas desta cidade onde moro. O meu corpo
tece horas já e nada se apaga como antes.

Onde estou, o frio é incessante e
às minhas mãos queimam-se fotografias como
se o passado não existisse mais.

De hoje em diante, irei apagar-me
em cada dia, para que nada reste dentro de mim
ou dentro da garrafa vazia.

Por isso te vejo a desaparecer
rapidamente, como um dente-de-leão ao vento
da minha voz, ao agredir-te sem que te
doa ou marque para sempre.

E para que os dias passem, bebo-me
de dentro das mãos. Como um vinho verde
que me corre no corpo e assim a visão do mundo
é mais carente - o frio que sinto é da
cidade.

Nada mais existe por aqui que me prenda
ou que me faça ficar. Visto a mala para
pensar na partida, carrego-me pela porta até
ao jardim que se estende lá fora, sem luz sem sol
nem calor.

Os meus pés já não caminham porque
não sabem. Porque todas as cartas me ensinaram
que a maneira como se pisa um ladrilho é igual
à de pisar um rosto

mesmo que de tal não se goste.

Por isso perco os sentidos nesta cidade
sem polícia e sem refúgios - como se fosse eu
o último a perder-me nas ruas labirínticas e
planas onde o vento me espalha a memória como
água em papel.



[Texto: Sérgio Xarepe]
[Foto: José Rui Moreira Correia]

11 comentários:

V. disse...

Ia jurar que esta foto foi tirada em Coimbra... acho que o meu irmão tirou uma neste mesmo sítio, a apontar ao candeeiro... :D

Sabes o que te digo? Faz falta uma noite de muita receita e muito karaoke à mistura! Aí é que nos íamos perder à vontade! Ehehehehe! :o)

Beijinho*

Andreia disse...

Menina Vanessa, isto é no Porto! Nessa bela, nossa, cidade! Ehehehehe

Sim, estou a precisar de receita, sem dúvida alguma! Então e isso é para quando?! :D
(E não vale dizer para a semana, porque ainda falta muito! :) )

Beijinho!

Happy and Bleeding disse...

bom, também podia ter sido tirada em guimarães, há muitas semelhanças :)
já não lia nada do Sérgio Xarepe há muito... é benhe é benhe.

Flávia Vida disse...

"(...) De hoje em diante, irei apagar-me em cada dia, para que nada reste dentro de mim ou dentro da garrafa vazia."

[lindo... aiai]

beijinhos
:)

ps: o Casulo agradece imensamente a sua visita e seu elogio. com certeza ele esperará ansiosamente por mais e mais vezes o seu vôo até ele. e por aqui a borboleta se perde em meio a tantas palavras e imagens lindas e encantadoras ...
o seu cantinho é mesmo encantador
outros beijos

Mateso disse...

Lindo.. lindo!
E a propósito, minha querida, sou uma mateso!
Bjinho.

MJ disse...

Passei por aqui (mais uma vez) mas, agora, para te dar os parabens e em simultâneo para agradecer...tudo isto...as fotografias, os textos, são simplesmente excelentes.

Obrigado
Maria João

Andreia disse...

Mateso: Só reparei no erro depois de te deixar o comentário. Tinha esperança que não tivessos reparado... :) Shame on me... :)

Maria João: Obrigada eu... :)

PostScriptum disse...

És mesmo menina dos olhos d´água!
Gosto das tuas transparências.
Beijos

musalia disse...

as cidades e o (des)aconchego das ruas, das pedras, das ruas solitárias...

:)

Letras de Babel disse...

Excelente.



Bjo

Andreia disse...

Postscriptum: Sabes que é aqui onde consigo ser mais transparente. E isso deve-o também a vocês todos, desse lado. Obrigada :)

Musalia: É esse (des) aconchego, são as ruas escuras e solitárias que me continuam, sempre, a fascinar nas cidades. Por isso gosto tanto do Porto :)

Letras de Babel: Sim, o Sérgio é muito bom :)

Beijinhos a todos!

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